sábado, 26 de março de 2011

O fim

Ela bate o portão. Ele vê tudo: seus ombros, suas costas, seus olhos de não. Acabou. É o tchau entalado na garganta e nada mais. Nada mais como tudo o mais que passou a nada ser. Fossem os segredos que nunca escaparam, fossem as coisas não ditas por medo. Tinha chegado ao fim. Isabel era assim; era o não, era o sim. A verdade é que ela era quase tudo ao mesmo tempo, e por isso não sobrava tempo para o resto que ela não era. Pedro, coitado, acabou se apaixonando por todas essas mulheres que eram uma só, ou por uma só mulher que conseguia ser tantas. Mas agora, ele estava ali, preso no chão como se raízes tivessem nascido, com os olhos marejados de lágrimas e um pedido sufocado. Ele queria dizer não para Isabel, queria pedir que ela não fosse. Mas Pedro não disse nada, e Isabel resolveu sozinha que tudo aquilo que valia a pena havia sido dito, e então exibiu seu orgulho como se fosse um troféu, e não deu sequer um beijo de adeus; deu foi as costas. Não se despediu de Pedro nem de nenhum dos momentos que eles tiveram juntos, como se quatro anos fossem mais ou menos uma semana de carnaval numa cidade de litoral em que você sequer se despede daquele romancezinho de verão ardente. Foi bom enquanto durou, mas foi só isso. E deu as costas para o tudo que eles foram, como se depois de tudo, não tivesse restado absolutamente nada. Para Isabel a vida recomeçava ali, no momento em que o portão bateu. Isabel tinha não somente muitas mulheres dentro de si, como o pior de todas elas. Ela tinha o orgulho, a desconfiança, o rancor, a impaciência. E Pedro havia se apaixonado também por tudo isso. E ele ficou ali, embalado por um amor que não o deixava ir embora, se perguntando com que cara encararia o mundo dali para frente e admirando como se pela a última vez a pele de pêssego das costas de Isabel.

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